Organizadores: Ana Lúcia de Moura Pontes, Felipe Rangel de Souza Machado, Ricardo Ventura
Entre as diversas crises emergidas no contexto da Covid-19, a saúde dos povos indígenas no Brasil foi uma das mais preocupantes e debatidas. A questão é enfatizada logo na apresentação do novo livro da coleção Saúde dos Povos Indígenas da Editora Fiocruz: Políticas Antes da Política de Saúde Indígena. "A pandemia tornou ainda mais evidentes as deficiências que permanecem na atenção à saúde indígena e a sua frágil articulação com os demais níveis de complexidade da rede SUS", destacam os organizadores e pesquisadores da Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca (Ensp/Fiocruz).
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Mas e nos anos que antecederam a pandemia? E antes mesmo da criação do nosso Sistema Único de Saúde? Quais foram os muitos caminhos, lutas e articulações que possibilitaram a construção de políticas públicas especificamente voltadas para a saúde indígena? É esse percurso que a coletânea busca - a partir de uma perspectiva histórica e antropológica - detalhar em 13 capítulos. O livro investiga o processo de formulação do atual Subsistema de Atenção à Saúde Indígena (SasiSUS). Instituído em 1999, pela lei nº 9.836 - também conhecida como Lei Arouca -, o subsistema foi criado no âmbito do SUS e idealizado para atender a população de territórios indígenas, através de uma estrutura composta de sistemas locais de saúde, denominados Distritos Sanitários Especiais Indígenas (DSEIs).
Ricardo Ventura enfatiza que a obra aborda as múltiplas redes de participação que envolveram a constituição da política nacional de atenção à saúde indígena no país. O volume tem como base as investigações conduzidas no âmbito da pesquisa "Saúde dos Povos Indígenas no Brasil: perspectivas históricas, socioculturais", coordenada por Ventura e Pontes. O projeto é financiado pela Wellcome Trust, fundação com foco em pesquisas de saúde sediada em Londres. O livro é dividido em duas partes, que dialogam e se complementam a partir de pesquisas, entrevistas e vasto acervo documental. Os 14 autoras e autores participantes "se reportam ao prolongado e complexo caminho percorrido até o que veio a ser a Política Nacional de Atenção à Saúde Indígena, que envolveu dimensões de protagonismo indígena e indigenista até o momento pouco explorados na literatura".
Denominada Contextos e Atores no Cenário da (In)Visibilidade da Saúde Indígena, a primeira parte da coletânea agrega seis capítulos, com textos dedicados à atuação de diferentes sujeitos políticos na área de saúde dos povos indígenas com foco predominante nas décadas de 1970 e 1980. Os outros sete capítulos integram a segunda parte, intitulada Trajetórias e Articulações na Formulação do Subsistema, com os autores se debruçando sobre as questões ligadas à reforma sanitária indigenista, relacionadas aos contextos regionais, nacional e até internacional.
As muitas participações de Ailton Krenak
O livro traz um registro histórico mais do que oportuno: o último capítulo é uma transcrição da primeira parte do Programa de Índio do dia 30 de novembro de 1986. Veiculado semanalmente na Rádio USP, o Programa de Índio foi ao ar de 1985 a 1990, sob o comando de Ailton Krenak. O episódio específico contou com as participações de Arouca e de Raoni, lançando luz sobre a "intensa articulação de múltiplas vozes, indígenas e não indígenas, e as redes de personagens e instituições que participaram da trajetória da atual política pública de saúde dos povos indígenas", analisam os organizadores.
Ativista, filósofo e poeta, Krenak assina o texto de orelha do livro. No papel de destacada liderança indígena durante a Assembleia Nacional Constituinte (1988) e ativo participante de assembleias e encontros indígenas na década de 1980, o escritor relembra o longo trabalho de colaborações e articulações que levaram à criação do SasiSUS. "É oportuna uma publicação que resgate o significado dessa luta histórica e as expectativas dos povos indígenas quanto à saúde como direito humano e obrigação do Estado", finaliza o ativista.
Sobre a organizadora e os organizadores
Médica sanitarista, Ana Lúcia de Moura Pontes é doutora em Saúde Pública pela Ensp/Fiocruz, onde é também pesquisadora. É coautora de Atenção diferenciada: a formação técnica de agentes indígenas de saúde do Alto Rio Negro (2019), livro que integra a coleção Fazer Saúde da Editora Fiocruz.
Graduado em Ciências Biológicas, Ricardo Ventura Santos é pesquisador titular da Ensp/Fiocruz e professor titular no Departamento de Antropologia do Museu Nacional da Universidade Federal do Rio de Janeiro (MN/UFRJ). É doutor em Antropologia pela Universidade de Indiana (EUA). É membro da Academia Brasileira de Ciências (ABC), tendo sido o primeiro pesquisador da Fiocruz a ser eleito para a área das Ciências Sociais do órgão. É autor e organizador de diversos livros pela Editora Fiocruz, sendo Entre Demografia e Antropologia: povos indígenas no Brasil o mais recente.
O cientista social Felipe Rangel de Souza Machado é doutor em Saúde Coletiva pelo Instituto de Medicina Social da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (IMS/Uerj). É pesquisador da Ensp/Fiocruz.
Sobre a coleção
Políticas Antes da Política de Saúde Indígena é a nona publicação de Saúde dos Povos Indígenas. A coleção publica estudos originais sobre as mais diversas facetas do processo saúde-doença dos povos indígenas, reunindo obras de autores nacionais e estrangeiros. Seus títulos são uma contribuição para a construção de enfoques teóricos inovadores que, no tocante à saúde, possibilitem estabelecer relações socialmente mais justas entre a sociedade brasileira e os povos indígenas. Todas as obras de Saúde dos Povos Indígenas encontram-se disponíveis para download gratuito na rede SciELO Livros. Clique aqui para acessar.
Primeira edição: 2021 | 404 páginas
ISBN (impresso): 978-65-5708-046-7
eISBN (digital): 978-65-5708-122-8
Prefácio
Apresentação
PARTE I - Contextos e Atores no Cenário da (In)Visibilidade da Saúde Indígena
1. O Direito à Terra, o Direito de Ir e Vir: saúde e movimento indígena a partir da década de 1970
2. Cinco Encontros e a Oitava: as ações de saúde do Conselho Indigenista Missionário (Cimi) no contexto pré-Constituinte
3. Estatísticas de Resistência e os Horizontes da Saúde Indígena na Ditadura Militar
4. “Uma Oportunidade Inusitada que Desaparece Rapidamente”: doenças infecciosas, populações indígenas e a produção de conhecimentos biomédicos na Amazônia, 1960-1970
5. A Ação Médico-Sanitária da Funai entre 1967 e 1988: uma contribuição à superação de ideias equivocadas
6. A Política Indigenista Governamental: aspectos ideológicos e administrativos da ação médico-sanitária entre as populações indígenas brasileiras, 1967-1988
PARTE II - Trajetórias e Articulações na Formulação do Subsistema
7. Debates e Embates entre Reforma Sanitária e Indigenismo na Criação do Subsistema de Saúde Indígena e do Modelo de Distritalização
8. A Emergência do Distrito Sanitário Yanomami: uma análise sociopolítica
9. A Longa Reforma Sanitária Indígena
10. Dos Organismos às Organizações: a estruturação do DSEI Leste Roraima e as mobilizações em torno da saúde indígena
11. Participação no Contexto Pré-Subsistema de Atenção à Saúde Indígena: a perspectiva das vozes indígenas
12. “Programa de Índio” para “Amansar” Branco
13. Programa de Índio
Apêndice – Breve apresentação dos entrevistados mencionados nos capítulos
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